Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa todo entendimento.
Clarice Lispector
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Eu estou lendo, a passo de tartaruga, esse livro. (Nunca li tão devagar na minha vida, depois dos 12 anos, eu acho. Mas com a rotina de falta de dormir não tenho conseguido. Ler com um bebê novinho era mais fácil com Tatá, talvez pq não tivesse a internet, pelo menos não dessa maneira de hoje, talvez pq eu fosse mais nova, porque era um filho só, enfim, podeser muita coisa, mas o fato continua eu não tenho dado conta daquilo que é um dops meus maiores prazeres.)
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Esse livro não é um livro que por enquanto está me chamando atenção especialmente não, mas é um boa leitura de ônibus. Ainda estou começando a segunda parte, posso gostar muito ainda, veremos.
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Mas outro dia me deparei com essa parte aí embaixo onde a autora fala mais ou menos que toda pessoa, e toda cidade têm uma palavra que a definem. O trecho é legal, podem ler aí embaixo.Então eu fiquei pensando qual seria a palavra que me definiria.
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Bem, definir eu acho muito forte, mas sem conseguir fazer nada de mais relevante nessa vida, pensei numa palavra que fala muito a respeito de mim. Eu já tinha certeza que minha palavra seria um verbo.
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Assim que li esse trecho, pensei em “conhecer”. Mas não, não é conhecer, se fosse eu seria mais viajante. Eu seria mais experimentadora, eu viveria mais de acordo com os sentidos, mas eu sou um pouco mais mental. Eu não tenho essa sede de conhecer mais, acho que já tive mais.
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Então descobri, minha palavra é ENTENDER.
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E a sua palavra?
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– Talvez você e Roma só tenham palavras diferentes.
– Como assim?
Ele disse:
– Você não sabe que o segredo para entender uma cidade e seus habitantes é aprender qual a palavra da rua?
Ele prosseguiu explicando, em uma mistura de inglês, italiano e gestos, que toda cidade tem uma única palavra que a define, que identifica a maioria das pessoas que mora ali. Se você pudesse ler o pensamento das pessoas que passam por você nas ruas de qualquer cidade, descobriria que a maioria delas está tendo o mesmo pensamento. Qualquer que seja esse pensamento da maioria – essa é a palavra da cidade. E, se a sua palavra pessoal não combinar com a palavra da cidade, então ali não é realmente o seu lugar.
– Qual é a palavra de Roma? – perguntei.
– SEXO – anunciou ele.
– Mas isso não é um estereótipo a respeito de Roma?
– Não.
– Mas com certeza existem algumas pessoas em Roma que pensam emoutra coisa que não sexo?
Giulio insistiu:
– Não. Todas elas, o dia inteiro, só pensam
lá no Vaticano?
– Aí é outra coisa. O Vaticano não faz parte de Roma- Eles lá têm um mundo diferente. A palavra deles é PODER.
– Eu chutaria FÉ.
– É PODER – repetiu ele- – Acredite
a palavra de Roma… é SEXO.
Se formos acreditar em Giulio, essa palavrinha – SEXO – calça as ruas que você pisa em Roma, jorra dos chafarizes daqui, enche o ar como o barulho do tráfego. Pensar nisso, vestir-se para isso, aceitar isso, recusar isso, fazer disso um esporte e um jogo – é só o que todo mundo está fazendo. O que faria um pouco de sentido para explicar por que, por mais linda que seja a cidade, eu não sinto que Roma seja exatamente o meu lar. Não neste momento da minha vida. Porque SEXO não é a minha palavra agora. Já foi, em outros momentos da minha vida, mas agora não é. Assim, a palavra de Roma, rodopiando pelas ruas, só faz esbarrar em mim e seguir seu caminho, sem causar nenhum impacto. Não participo da palavra, portanto não estou morando aqui por completo. É uma teoria maluca, impossível de se provar, mas eu até que gosto dela.
– Qual a palavra de Nova York? – perguntou Giulio. Pensei no assunto por um instante e me decidi.
– E um verbo, é claro. Eu acho que é CONQUISTAR.
(O que é sutil mas significativamente diferente da palavra de Los Angeles, acho eu, que também é um verbo: CONSEGUIR. Mais tarde, compartilharei essa teoria toda com minha amiga sueca Sofie, e ela emitirá a opinião de que a palavra das ruas de Estocolmo é CONFORMAR, o que deixa nós duas deprimidas.)
– Qual a palavra de Nápoles? – perguntei a Giulio. Ele conhece bem o sul da Itália.
– BRIGAR – decide ele. – Qual era a palavra da sua família quando você era pequena?
Essa era difícil. Eu estava tentando pensar em uma só palavra que, de alguma forma, conjugasse FRUGAL e IRREVERENTE. Mas Giulio já havia passado í pergunta seguinte e mais óbvia:
– Qual é a sua palavra?
Eu definitivamente não soube responder isso.
No entanto, depois de algumas semanas pensando no assunto, ainda não consigo responder. Conheço algumas palavras que com certeza não são. A minha palavra não é CASAMENTO, isso é óbvio. Não é FAMíLIA (embora essa seja a palavra da cidade na qual vivi durante alguns anos com meu marido e, como não me encaixei nela, esse foi um dos grandes motivos para o meu sofrimento). A minha palavra não é mais DEPRESSíƒO, graças a Deus. Não tenho medo de compartilhar a palavra de Estocolmo, CONFORMAR. Mas tampouco sinto que a palavra de Nova York, CONQUISTAR, seja mais tão condizente comigo, embora esse de fato tenha sido meu mundo dos 20 aos 30 anos. Minha palavra pode ser BUSCAR. (Mas, vamos ser honestos: poderia com a mesma facilidade ser ESCONDER-SE.) Durante os últimos meses na Itália, a minha palavrafoi basicamente PRAZER, mas essa palavra não combina com todas as parte de mim, ou então eu não estaria tão ansiosa para chegar í índia. A minha palavra pode ser DEVOí‡íƒO, embora isso me faça soar mais boazinha do que sou e não leve em conta a quantidade de vinho que tenho bebido.
Não sei a resposta, e imagino que seja essa a finalidade deste ano de viagem. Encontrar a minha palavra. Mas uma coisa eu posso dizer com segurança – ela não é SEXO.
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Título: Comer, Rezar, Amar
Subtítulo: A Busca de Uma Mulher Por Todas as Coisas da Vida na Itália, na índia e na Indonésia
Autor: Elizabeth Gilbert
Editora: Objetiva
Edição: 1a. edição, 2008
Idioma: Português
Número de páginas: 344 páginas
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